Foi preciso chegar aos 43 anos para Andy Woodward, antigo futebolista britânico, ganhar coragem e revelar publicamente que, em criança, foi vítima de abusos sexuais por parte de Barry Bennell, treinador já condenado por pedofilia. “A minha vida esteve arruinada até aos 43 anos. Só agora sinto que posso viver sem o segredo e essa ferida horrível”, diz ao jornal The Guardian, ao qual conta a sua história.
“Quero deitar tudo cá para fora e dar às outras pessoas a oportunidade de fazer o mesmo. Quero dar força a essas pessoas. Eu sobrevivi. Perdi a minha carreira, que era muito importante para mim, mas ainda aqui estou”, afirma para justificar a decisão de vir agora a público. Andy Woodward, que jogou pelo Sheffield United, pelo Scunthorpe Unuited ou pelo Halifax Twon, conta que chegou a simular lesões para sair de campo quando estava a ter um ataque de pânico, algo que se tornou frequente ao longo da carreira e que teve tendências suicidas pelo menos em 10 ocasiões. A depressão e a ansiedade foram constantes.
“Desde os 11 anos que vivo com um segredo. E viver com um segredo é provavelmente uma das coisas mais difíceis de fazer. Se olharem para a minha carreira verão que fui atormentado por algumas lesões. Muitas dessas lesões foram na verdade lesões mentais”, diz ao jornal.
A carreira terminou cedo, aos 29 anos, porque não suportava as feridas psicológicas derivadas dos abusos por parte de Barry Bennel, o homem que o descobriu e recrutou para o Crewe Alexandra, como fez a tantos outros nas décadas de 1980 e 1990 e que, segundo o The Guardian, já tivera ligações ao Stoke City e ao Manchester City.
Em 1998, Bennell foi condenado a nove anos de prisão depois de admitir 23 crimes de abusos sexuais a rapazes entre os nove e os 15 anos. Woodward foi uma das vítimas e, segundo contou ao The Guardian, é perseguido pelo que este homem fez e lhe disse que fez.
Andy Woodward conta que, no início, ao ser recrutado por Barry Bennel, em casa de quem passou a viver aos fins de semana e férias, tudo lhe parecia um sonho: além de ser a oportunidade para uma carreira profissional, este tinha em casa uma mesa de bilhar, um macaco e todo o tipo de coisas que uma criança adora. “Eu era uma criança, confiava nele para começar”, diz.
Quando os abusos começaram, Barry Bennel usava os trunfos das guloseimas e da chantagem, nomeadamente ao mostrar-lhe como era um “mestre” a usar as matracas e como poderia tirá-lo do futebol.
Quando Andy Woodward fez 14 anos e já era completamente manipulado pelo treinador, este começou a namorar com a sua irmã, de 16 anos. O jovem jogador foi obrigado a manter-se em silêncio, a participar em refeições em família e até a presenciar o casamento dos dois. Sempre sem dizer nada acerca do homem que o violava e que se tornara seu cunhado. “Tive de assistir ao casamento, estar ali na igreja, quando o que eu queria mesmo era cortar-lhe a garganta. Era uma tortura – é a única palavra para o descrever”, diz ao The Guardian.
Woodward tinha 24 anos quando o agressor sexual foi detido, na sequência da denúncia por uma outra vítima. Barry Bennel voltou a ser condenado em 2015 a mais dois anos de prisão num outro processo de pedofilia.