“Não quero ser apenas o tipo que te engravidou” *

Passaram-se três meses desde a noite que ia mudar a minha vida. Eu e a Cátia não mais tínhamos falado. Trocámos umas mensagens depois do nosso encontro, mas foi só isso. Os dias foram passando e quantos mais passavam, mais quintas e sábados tinha aproveitado para conhecer outras mulheres. Até que ela me ligou para nos encontrarmos nesse mesmo dia. Combinámos num café perto do escritório dela.
            – Estou grávida de três meses. Disse-me mal nos sentámos, sem sequer termos feito conversa de circunstância.
            – Para me estares a dizer isso, calculo que seja meu, respondi, sem ter noção que a frase não era muito simpática.
            – Se vais te armar em parvo, vou-me já embora, retribui a Cátia, ao mesmo tempo que se vai levantando devagar.
            – Espera, não vás, não era isso que queria dizer. Apanhaste-me desprevenido. Ela acalmou-se e contou-me o que tinha pensado: – Só te disse agora, porque está tudo bem com o bebé. Nos primeiros tempos pensei muito sobre o melhor a fazer: se abortava ou se seguia com a gravidez. Não é que quisesse ser mãe agora, mas os anos vão passando, já não caminho para nova…
            – E que papel me reservaste nos teus planos de futuro? Perguntei…
            – Não quero que te sintas obrigado a nada, mas quero que o nosso filho tenha um pai com papel ativo na sua vida, mesmo que não estejamos juntos, disse-me, acrescentando que tinha pensado no nome de Simão.
            – É muita informação, Cátia. Não nos víamos há três meses, venho ter contigo sem saber a razão… Tens que me dar tempo para colocar as ideias em ordem.
            Levantou-se, deixou moedas para pagar o café dela e disse:
– Sim, claro. Tenta é não demorar mais de seis meses, porque senão vais perder o nascimento do teu filho. Já em pé e virada para a porta, voltou atrás e rematou:
– Já agora, fica sabendo que não percebo porque nunca mais quiseste estar comigo. Achei que aquela noite seria o início de algo. Pelos vistos enganei-me. E seguiu o seu caminho, não me dando tempo para responder ao ataque final.
            Fiquei mais uma hora, sentado, como que anestesiado. Arrumei com dois uísques pelo meio. Pensei em muitos cenários. Na reação dos meus pais, que há anos me pediam netos. Pensei nas minhas quintas e sábados. Pensei se o Zé daria um bom padrinho. Pensei no que o pai dela, meu antigo treinador, teria dito quando soube. Se teria ficado contente ou nem por isso ao saber que era eu o pai da criança. Pensei em tudo, mas não queria pensar no mais importante: e agora? Não pensava em ter filhos tão cedo. Nem sabia se os quereria ter sequer. E agora vou ter um Simão. Nem tive voto na matéria para escolher o nome.
            Passaram-se uns dias sem falar com ela. Não tinha nada para lhe dizer, por enquanto. Não contei nada aos meus pais. Nem ao Zé e ao Paulo. O que eles me poderiam dar eram opiniões, que valem muito ou pouco, consoante interessam a quem tem que decidir. E eu não queria ser influenciado. Vistas bem as coisas, a solução até parecia simples. Tínhamos sido namorados em miúdos, a química continuava bem presente, como ficou provado, e estávamos ambos sozinhos. Então porque raio sentia-me com dúvidas? Eu sabia porquê, mas era mais fácil fazer-me de desentendido. Estava habituado a ser rei e senhor da minha vida e para mim as mulheres eram tao descartáveis como fraldas. O trabalho era uma rotina enfadonha, sinónimo de ordenado, só isso. A situação Cátia-Simão caiu de paraquedas na minha vida, a qual não era assim tão especial para me custar tanto despedir dela. Pela primeira vez, enquanto adulto, ia fazer o correto. Ia fazer os meus pais terem orgulho no filho.
            Fui ter com a Cátia e agora cabia a mim dizer-lhe quais os meus planos: – Quero estar todos os dias presentes na tua gravidez e na vida do Simão. Quero ir às consultas contigo, ver as ecografias, fazer perguntas parvas à médica, fazê-lo sócio do Benfica mal nasça. Quero ir comprar morangos a meio da noite, se acordares com desejo disso. Não quero ser apenas o tipo que te engravidou. Não quero que o nosso filho pense mais tarde que foi resultado de uma queca de uma noite. Quero que ele saiba que quando nasceu, os pais passaram a ser as pessoas mais felizes do mundo. Durante alguns segundos, a Cátia não disse nada. Olhou-me de uma forma que nunca o tinha feito até então. Percebi que a qualquer momento lágrimas iam abençoar aquele momento de ternura. Abraçou-me e disse-me ao ouvido: – Foste o meu primeiro amor e agora quero que sejas o último.
* (excerto de futuro livro)

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